Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo.
É preciso evitar o consumo de bebida alcoólica antes ou
depois de tomar vacina contra a Covid? Não, mas a ideia de que é necessário
cortar o álcool no período de imunização é um mito que tem se espalhado nesta
campanha, constata a médica Mônica Levi, diretora da Sociedade Brasileira de
Imunizações (SBIm).
A entidade, que inclusive ajuda nas decisões do Programa
Nacional de Imunização (PNI) junto ao Ministério da Saúde, não tem qualquer
recomendação neste sentido.
— Há muito tabu e muito despreparo dos profissionais da
saúde que estão nas salas de vacinação — avalia Levi. — Infelizmente o Brasil
não deu conta de fazer um bom treinamento dos profissionais, e cada um fala o
que quer — conclui.
Para Levi esse boato é preocupante, porque pode desestimular
a proteção de parte da população. Entre o 1,5 milhão de pessoas que não
apareceram para tomar a segunda dose contra a Covid, número que o Ministério da
Saúde divulgou nos últimos dias, podem estar alguns que foram impactados por
essa desinformação quanto às bebidas alcoólicas, projeta a médica.
O mito se traduz tanto em receio de que a vacina não
funcione quanto de que provoque uma reação indesejada, mas os fabricantes dos
imunizantes usados no Brasil, CoronaVac (criado pela biofarmacêutica chinesa
SinoVac) e Covishield (do laboratório AstraZeneca em parceria com a
Universidade de Oxford), não veem comprometimento do efeito nem o risco de
eventos adversos ligados às bebidas. Nos estudos clínicos, os voluntários não
precisaram ter nenhum cuidado quanto a isso.
Também não há nada a respeito nas bulas de ambos, afirma a
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), órgão responsável por
avaliar e liberar os produtos no país. A reportagem consultou ainda o Instituto
Butantan, que produz a CoronaVac, a Fiocruz, responsável pela Covishield, e o
Ministério da Saúde. Todos afirmam que não há por que se preocupar.
“Não há nenhuma evidência sobre a relação do álcool com o
comprometimento da formação de anticorpos promovida pela vacina Covid-19”, diz
a pasta, em nota enviada por sua assessoria de imprensa.
Em contraste com as informações oficiais dos fabricantes e
das autoridades de saúde, não é incomum ver nas redes sociais publicações
falando de orientações assim recebidas no momento da imunização. Um vídeo que
viralizou nas últimas semanas mostra um senhor surpreso ao ouvir da
profissional de saúde que terá de esperar 30 dias para tomar uma cerveja.
“Égua, tira de volta isso”, brinca ele.
O portal de notícias Ver-o-Fato, de Belém, noticiou que a
gravação foi feita em um posto de vacinação drive thru da cidade. A Prefeitura
de Belém não confirma o local da filmagem, mas, em nota, explica que há sim uma
orientação no município, só que mais curta. “O recomendado é de 24 a 48 horas
ficar sem beber, mas por questão de efeito colateral”, escreve a assessoria de
imprensa da Secretaria Municipal de Saúde. “Não tem nenhuma orientação para que
as vacinadoras digam que tem que ficar um mês sem beber”, completa.
A abstinência também é recomendada, por exemplo, pela
Prefeitura de Fortaleza. Segundo a gestão, o consumo de álcool deve ser evitado
“por pelo menos 24 horas do período de aplicação de qualquer vacina ofertada
pela rede pública”.
Para a SBIm nada disso faz sentido. Uma resposta menor do
sistema imunológico só deve ser uma questão entre as pessoas que fazem consumo
pesado de álcool, especialmente aquelas que já têm uma doença hepática. Elas,
ainda assim, não têm nenhuma contraindicação para tomar a vacina, ressalta
Levi. Pelo contrário, quem abusa do álcool tende a ser mais suscetível a
infecções e, por isso, deve buscar a proteção assim que possível.
No caso dos bebedores pesados, a orientação do Centro de
Informações sobre Saúde e Álcool (Cisa) é a de que tentem parar ou pelo menos
diminuam o consumo durante o processo de imunização.
— A preocupação que a gente tem não é só com a vacina, é por
toda a questão do consumo pesado de álcool em tempos de pandemia. É importante
que as pessoas tenham um controle do consumo — avisa a biomédica Erica Siu,
vice-presidente do Cisa.
A ingestão moderada, o famoso “beber socialmente”, ela diz,
é calculada como sendo de, no máximo, uma dose por dia para mulher e até duas
doses por dia para homem.
— É importante a gente destacar o conceito de dose. Uma dose
padrão são 350 ml de cerveja ou 150 ml de vinho ou 45 ml de destilado — afirma.
O Globo via Blog do BG.