A CPI da Covid da Assembleia
Legislativa do Rio Grande do Norte indiciou políticos, servidores públicos e
empresários na investigação que trata sobre a compra frustrada de 300
respiradores pelo Consórcio Nordeste, que custou R$ 48,7 milhões aos cofres dos
nove estados da região. Após quatro meses e meio de trabalho, com juntada de
milhares de documentos e convocação de 72 testemunhas, convidados e
investigados, a CPI concluiu, nesta quinta-feira (16), pelo indiciamento por
improbidade administrativa da governadora Fátima Bezerra, do governador da
Bahia, Rui Costa, dos ex-ministros de Estado Carlos Gabas e Edinho Silva (atual
prefeito de Araraquara/SP), do Secretário de Saúde do Rio Grande do Norte,
Cipriano Maia. Além deles, empresários e outros servidores públicos também
foram indiciados.
A contratação se iniciou a partir
do Ofício Circular de 6 de abril de 2020, assinado pelo secretário-executivo do
Consórcio, Carlos Gabbas, pelo qual solicitou aos estados-membros, em um prazo
máximo de 12 horas, a transferência dos valores correspondentes à aquisição de
30 ventiladores pulmonares, por R$ 164.917,86 cada, totalizando R$ 4.947.535,80
para cada estado. Os respiradores não foram entregues e o dinheiro não foi
devolvido. Pelo contrário, várias pessoas confirmaram que receberam valores e,
também em depoimentos, um engenheiro disse que o equipamento que seria
produzido no Brasil custaria R$ 15 mil, valor quase 11 vezes menor que o
cobrado pela Hempcare e pago pelos estados. Na investigação da CPI,
parlamentares ouviram versões e a maioria dos membros chegou à decisão sobre o
indiciamento.
Anteriormente, o relatório do
deputado Francisco do PT, apresentado na semana passada, havia sugerido o
indiciamento de quatro pessoas por estelionato: Cristiana Prestes Taddeo e Luiz
Henrique Ramos Jovino, da Hempcare, além dos empresários Paulo de Tarso Carlos,
da Biogeoenergy, e Cleber Isaac Ferraz Soares. Porém, na sessão desta
quinta-feira, os deputados Gustavo Carvalho (PSDB), Getúlio Rêgo (DEM) e o
presidente da CPI, Kelps Lima (Solidariedade), apresentaram voto parcialmente
divergente, que foi aprovado e acrescido ao relatório.
No entendimento dos
parlamentares, a investigação considerou que há materialidade para a acusação
de improbidade o fato do secretário Cipriano Maia e da governadora Fátima
Bezerra terem transferido quase R$ 5 milhões dos cofres do Governo do Estado
para o Consórcio Nordeste sem justificativa contratual. A transferência do
dinheiro ocorreu no dia 7 de abril, quando a ordenação de despesa só foi
confeccionada no dia 14 de abril. Além disso, o contrato dos respiradores só
foi assinado no dia 22 de abril. Para os deputados que sugeriram o voto
divergente, a situação está "flagrantemente fora do que determina a
lei". "Mesmo com o secretário Cipriano Maia afirmando que a governadora
não tinha conhecimento sobre a liberação dos quase R$ 5 milhões do Rio Grande
do Norte para o Consórcio, a narrativa não se sustenta, até porque a
governadora é a representante do Estado no Consórcio", disse Kelps Lima.
"O resultado é que até hoje nenhum dos respiradores foi entregue ao Rio
Grande do Norte e o dinheiro desapareceu", criticou.
Apontando que houve "nível
sem precedentes de negligência", Kelps Lima disse que também deveriam ser
indiciados também o governador da Bahia, Rui Costa, que era o presidente do
Consórcio Nordeste, e o ex-ministro Carlos Gabas, até hoje o
secretário-executivo do Consórcio Nordeste e que já ocupava o cargo na ocasião
do pagamento do contrato investigado.
Outro político indiciado pela
CPI, e que não estava entre os indiciados anteriormente, é o ex-ministro Edinho
Silva, atual prefeito de Araraquara. O motivo para o indiciamento foi a falta
de explicação para recebimento de doação de R$ 4 milhões em respiradores da
empresa Hempcare, que recebeu os R$ 48,7 milhões do Consórcio Nordeste. A
justificativa para a doação, que não chegou a ser concluída, foi, de acordo com
os membros da CPI, um pedido de Carlos Gabas, que disse que Edinho Silva era
"um irmão". O pedido teria sido uma condição para que o Consórcio
Nordeste fechasse o negócio com a Hempcare.
"O secretário do Consórcio
colocou os interesses de um aliado político, de Araraquara, acima dos
interesses do Consórcio Nordeste. Por esse motivo, sugerimos que a governadora
Fátima Bezerra solicite a imediata demissão de Carlos Gabas. Caso não seja
atendida, que determine a retirada do Rio Grande do Norte do Consórcio",
disse Kelps Lima.
O voto divergente ainda promoveu
o indiciamento do servidor do Consórcio Nordeste Valderir Claudino Souza e do
ex-secretário do Gabinete Civil da Bahia Bruno Dauster.
Por outro lado, os deputados
Francisco do PT e George Soares (PL) criticaram o indiciamento de Fátima
Bezerra e também do secretário Cipriano Maia. Enquanto George Soares disse que
o indiciamento dos gestores não tinham qualquer razão plausível, Francisco do
PT disse que as acusações contra a gestora e o secretário foram genéricas.
"A história haverá de provar quem está com a verdade", disse.
Confiram pedidos de indiciamentos
referentes ao contrato de compra de respiradores pelo Consórcio Nordeste:
Cristiane Prestes Taddeo, Luiz
Henrique Ramos Jovino e Paulo de Tarso Carlos - corrupção ativa (art. 333 do
Código Penal), fraude em licitação (art. 337-L, V do Código Penal) e associação
criminosa (art. 288 do Código Penal). São donos da Hempcare
Cléber Isaac - associação
criminosa (arts. 288 do Código Penal) e corrupção ativa (art. 333 do Código
Penal) - (Há documentação que sugere ter ele recebido R$ 3.000.000,00 por ter
facilitado o contato da Hempcare junto ao Consórcio Nordeste)
Fernando Galante - associação
criminosa (arts. 288 do Código Penal) e corrupção ativa (art. 333 do Código
Penal) (A CPI não foi capaz de coletar nenhuma informação apta a justificar o
recebimento de R$ 9.000.000,00, oriundos diretamente da contratação da HempCare
com o Consórcio Nordeste; Os documentos e os depoimentos coletados não denotam
a prestação de nenhum tipo de serviço ou assessoria, por parte do senhor
Fernando Galante, que viesse a justificar que lhe fosse destinado
aproximadamente 19% do valor total do contrato).
Bruno Dauster - (ex-secretário do
Gabinete Civil da Bahia) contratação direta ilegal, nos termos dos arts. 337-E
do Código Penal e por improbidade administrativa - (Além disso, a documentação
produzida informa que Bruno Dauster era a pessoa que estava à frente das
negociações, inclusive, declinando o servidor Valderir Claudino, para tratar
com a sra. Cristiane sobre os detalhes relacionados ao contrato e liberação dos
valores, tratativas que vieram a resultar na elaboração do contrato pelo próprio
advogado da empresa HempCare, que o redigiu de forma a ignorar as cautelas
inerentes à administração pública, e resguardar a empresa de qualquer sanção,
inclusive da apresentação de garantia.).
Carlos Gabas - indiciamento nos
termos do crime de corrupção passiva (art. 317 do Código Penal), contratação
direta ilegal (art. 337-E do Código Penal), bem como art. 10°, X e XII da Lei
8.429 (agir ilicitamente na arrecadação de tributo ou de renda, bem como no que
diz respeito à conservação do patrimônio público; e permitir, facilitar ou
concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente). (Secretário-executivo
do Consórcio Nordeste)
Rui Costa - indiciamento nos
termos do art. 10°, XI da Lei 8.429 (liberar verba pública sem a estrita
observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua
aplicação irregular) (A documentação sigilosa fornecida pelo PGE/BA, indica que
alterações contratuais ocorreram posteriormente à análise pelo órgão
consultivo, pouco antes da assinatura, no próprio Gabinete da Casa Civil,
mudança que tornou os termos do Contrato extremamente prejudiciais ao ente
público, sem qualquer reavaliação por parte do órgão jurídico, uma vez que o
parecer da PGE não analisou o instrumento contratual que foi assinado pelo
Consórcio e a HempCare)
Valderir Claudino Souza - (ficou
evidenciado por meio de laudo pericial, que foi o servidor responsável por ter
inserido e manuseado os documentos digitais previamente à assinatura do
contrato sem cláusula de garantia, que, conforme declarações, foi redigido pela
própria assessoria jurídica da HempCare, razão pela qual entendo cabível a
solicitação de promoção de indiciamento nos termos dos arts. 337-E do Código
Penal e por improbidade administrativa, nos termos do art. 10°, XII da Lei
8.429.)
Edinho Silva - art. 337-F do CP
(Frustrar ou fraudar, com o intuito de obter para si ou para outrem vantagem
decorrente da adjudicação do objeto da licitação, o caráter competitivo do
processo licitatório), na medida em que o depoente Paulo de Tarso Carlos
expressamente informou que o senhor Edison Silva possivelmente teve
conhecimento prévio sobre a contratação com o Consórcio Nordeste, supostamente
tendo ciência da intenção de doação de respiradores ao município paulista, como
contrapartida para contratação da HempCare, desde antes da formalização da
doação.
Cipriano Maia e Fátima Bezerra -
nos termos do art. 10°, XI da Lei 8.429, decorrente de violações expressas às
normas descritas nos art. 8° da Lei 11.107 e art. 13 do Decreto 6.017 (liberar
verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de
qualquer forma para a sua aplicação irregular)
Fonte: ALRN.